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A Fonte da Identidade Cristã

Texto por: Henrique Santos | Foto: Sasha Kim



A pergunta a respeito de "quem é o ser humano?" pode ser respondida de várias maneiras, mas nunca de maneira exaustiva, e nunca é fácil. O que o homem pode saber de si mesmo e dizer em relação a si é objeto de debate há séculos, na religião, na filosofia, na ciência, nas conversas ordinárias e informais, etc., mas a sociedade, através de suas convenções, sempre produziu conceitos ou narrativas para fornecerem uma rede de significado e sentido em que o sujeito pode encontrar sua identidade. Essas convenções sociais servem como recursos disponíveis ao indivíduo, ajudando-o a construir o entendimento que este tem de si.


Para Charles Taylor, filósofo social que concentra boa parte da sua obra sobre este tema, a identidade está intimamente vinculada com os compromissos morais do indivíduo, para as coisas que ele direciona seus afetos e define como prioridade. A partir daí, Taylor defender algo que ele chama de horizontes inescapáveis, que são planos de fundo que conferem ou definem o significado e a importância das coisas. A identidade é sempre desenvolvida diante de padrões já existentes de moral e valores, ela é construída a partir de “fontes morais”.


Quais são as fontes da identidade moderna? Segundo Taylor, suas fontes morais são os ideais de autonomia e liberdade autodeterminada, que passaram a ser afirmadas no período pós-romântico. A fonte moral da identidade não está para além do individuo, mas na sua interioridade. Seu “eu” é sua própria referência.


Be yourself é o imperativo cultural da nossa era. Somos convocados a sermos idênticos a nós mesmos, mas o que somos se não espelhos?

Constitucionalmente sempre seremos um reflexo do que amamos, ou adoramos. O filósofo cristão James K.A. Smith diz o seguinte: “O centro da gravidade de nossa identidade fica localizado no coração: na região visceral dos nossos anseios e desejos, na região mais profunda do kardia.”.


Os teóricos sociais já admitiram a inevitável necessidade do social para construirmos nossa autopercepção, nossa identidade. Só somos alguém com a ajuda de outro alguém. Para o teólogo e exegeta Richard Lints, a Bíblia já disse isso ao afirmar que o ser humano foi feito à imagem e semelhança de Deus. O ser humano nasceu para ser o reflexo de outra pessoa, ser reflexo de Deus. Sob esta perspectiva o ideal de identidade moderna, conforme descrito por Taylor, é só mais um desdobramento da queda do homem.


O homem foi criado para que sua identidade floresça primariamente da comunhão dele com Deus, e depois da sua relação com seus semelhantes.

Somos uma imagem que reflete a Deus no seu santo templo, que é toda criação, esse reflexo é cultivado por meio do relacionamento com Deus. A ordem do ser humano, a partir disso, é cuidar, governar e encher a terra.


A idolatria acontece quando o homem tenta encontrar satisfação em outras coisas que não são o Deus Criador, perdendo seu senso de propósito e refletindo de forma distorcida quem Deus é, assim como um espelho quebrado, corrompendo, portanto, sua identidade.


Só em Cristo existe a possibilidade do ser humano ser plenamente o reflexo de Deus e ter sua identidade realinhada com os propósitos de dele. Cristo é o meio pelo qual Deus salva a humanidade e revela o ser humano perfeito ou a perfeita imagem de Deus. Jesus não é somente o caminho à salvação, mas a plena revelação daquilo que os homens devem se tornar após a salvação.


Jesus é o ponto de referência para a construção da identidade pessoal daqueles que creram nele.

Isso é claramente percebido na orientação do Apóstolo Paulo “Tenham entre vocês o mesmo modo de pensar de Cristo Jesus” (Fl 2.5 NAA), que é um chamamento para que os crentes incorporem o estilo de vida de Cristo, que é demonstrado na descrição da vida e obra de Jesus que segue o texto mencionado (Fl 2.6-11).


Cristo para o cristão não é uma mera referência entre outras para a definição da sua identidade, mas é quem define radical e definitivamente quem o cristão é. A identidade que o sujeito recebe ao se unir a Cristo o conduz a uma nova maneira de perceber e planejar a sua vida, tendo o ato de autodoação de Jesus na cruz como parâmetro de autocompreensão e comportamento.


De acordo com aquilo que Deus fala a respeito dos que creram no seu filho, Kevin Vanhoozer, outro importante teólogo, revela a importância da narrativa canônica da história de Jesus, presente nos evangelhos, pois nela são percebidos, por meio dos ensinamentos e atos, os paradigmas éticos e comportamentais pelos quais se constrói a identidade cristã. A doutrina, portanto, é uma maneira de introduzir as pessoas naquilo que Vanhoozer chama de "o drama divino", orientando o sujeito humano na sua trajetória de vida, descrevendo seu verdadeiro eu.


A identidade cristã conduz a uma vida cruciforme, de amor e autodoação, pois é na entrega de Jesus que Deus se revela e revela seu propósito para humanidade, revela o que significa ser humano.


A fonte da identidade cristã é Jesus de Nazaré, conforme descrito e revelado nas sagradas letras. Não somos convocados a sermos nós mesmos, mas somos convocados para sermos Cristo e, então, seremos e saberemos quem realmente somos. Fé para salvação não é somente fé para podermos passar a eternidade com Deus, mas é confiar que só Deus pode definir quem somos. É Ele é e somente Ele que pode resgatar nossa identidade pessoal.


Que Jesus seja o Senhor de tudo em nós, inclusive da forma que percebemos a nós mesmos.


 

Henrique Santos é obreiro em tempo integral no Ministério Anunciando a Cristo e teólogo. Casado com Pâmela, congrega no Ministério Anunciando a Cristo em Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul.






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