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Não Espere Envelhecer para Amadurecer


Texto Por: Juliano Marold | Fotografia: Harun Tan / Atul Pandey



Orígenes, um dos pais da igreja, aos 16 anos de idade, assumiu a responsabilidade de uma família de seis membros, devido ao martírio de seu pai, Leônidas; e aos 18, no ano 203, sucedeu a Clemente na direção de uma escola de teologia cristã, em Alexandria.

Em 1780, William Wilberforce, com apenas 21 anos de idade foi eleito membro do Parlamento Inglês, tendo se dedicado incansavelmente à abolição do tráfico de escravos e da própria escravatura em si.

Em 1854, aos 20 anos de idade, Charles H. Spurgeon, o “príncipe dos pregadores”, assumiu o pastoreio de uma pequena congregação que se reunia na Capela New Park Street, em Londres, embora já fosse pregador desde os 16. Em 1891, pouco antes da morte de Spurgeon, a igreja, agora chamada Tabernáculo Metropolitano, contava com mais de cinco mil membros.

Esses são apenas alguns exemplos de heróis da história da igreja, que assumiram grandes responsabilidades, em diferentes áreas, ainda muito jovens.

Será que eles estavam realmente prontos pra isso? Alguém poderia perguntar. Normalmente, quando perguntamos a uma pessoa se ela está pronta para algo, estamos querendo saber se ela está preparada.

Estar pronto é simplesmente estar disposto, mesmo que não preparado.

Agora, uma outra pergunta interessante de se fazer é, será que esses homens e tantos outros ao longo da história sentiam-se prontos – no sentido de preparados – para assumir os encargos e responsabilidades que assumiram, sendo tão jovens?

Só podemos conjecturar, mas uma coisa é certa, eles estavam dispostos, e, a julgar pelo restante de suas jornadas, é lícito concluir que, sentindo-se preparados ou não, de alguma forma, eles deram conta do recado.

Um dos grandes problemas do nosso tempo é que muitos homens, mesmo cristãos, nunca se sentem prontos para lidar, de forma apropriada, com as responsabilidades e desafios com os quais se deparam ao longo da vida. De certa forma, e não raras vezes inconscientemente, eles tentam prolongar a infância - ou adolescência - o tanto quanto possível.

Ora, a infância carrega consigo uma pluripotencialidade, que é, na superfície, muito empolgante, afinal, enquanto somos crianças, há um mundo de possibilidades à nossa frente. Tudo que queremos ser ou fazer, está logo ali, em algum lugar no futuro, aparentemente ao nosso alcance.

Contudo, diz Jordan Peterson, o famoso psicólogo canadense, em uma de suas palestras, "o problema de ser uma criança é que tudo que você é, é potencial. Você pode ser qualquer coisa, mas não é nada. É necessário sacrificar algo para o amadurecimento. É necessário sacrificar a pluripotencialidade da infância pela realidade".

Para exemplificar: arrumar um emprego modesto para manter-se sem o patrocínio dos pais pode não ser tão empolgante para o jovem que sonha e pensa que reinventará a roda, mas é algo concreto, real, e pode abrir portas não imaginadas, além de pavimentar o caminho da maturidade.

O adiamento da maturidade e a correspondente ausência de responsabilidades significativas pode dar ao homem a sensação de que ele está se saindo melhor do que os outros, tão atarefados com o trabalho, esposa, filhos, igreja, etc. No entanto, há um preço a pagar por isso, e a conta chegará cedo ou tarde.


Um dia esse homem pode “despertar” e perceber que nada construiu, nada fez de relevante com o tempo que lhe foi dado até então. E esse é um duro golpe.

Bem, mas um homem com seus 30 ou 40 anos ainda é jovem, tem toda vida pela frente, alguém poderia dizer. Será? E se a vida lhe for tirada? E se sua peregrinação terrena chegar ao fim prematuramente? Em tempos de pandemia, isso certamente não soa tão estranho, por mais triste que seja. Nunca pensamos que nosso tempo aqui pode ser mais curto do que gostaríamos.

Mas deixe-me dar-lhe perspectiva: o missionário David Brainerd morreu aos 29 anos, em 1747, tendo gastado seus últimos cinco anos de vida pregando o evangelho aos índios de Delaware, na região de New Jersey/EUA. Os diários desse jovem herói de Cristo chegaram até nós por intermédio de Jonathan Edwards, para o qual a vida de Brainerd foi um exemplo da verdadeira piedade, no coração e na prática. Porque sua vida e ministério foram tão breves? Simplesmente não sabemos, a resposta está nos decretos eternos de Deus e sua providência.

Merece destaque o fato de que Brainerd, em sua juventude ficou órfão de pai e mãe. Seu pai faleceu quando ele tinha nove anos de idade apenas, e sua mãe, quando ele tinha 14. Como muitos de nós, ele não teve um pai para lhe guiar enquanto crescia. É verdade que a ausência de uma intervenção paterna piedosa pode ter prejudicado muitos homens em suas jornadas rumo à maturidade.

Isso, aliado à cultura e ideologias vigentes, resultou num mundo de homens “não iniciados”, para usar a linguagem do escritor John Eldridge. Segundo ele, nos dias de hoje temos homens parciais, “meninos, em sua maior parte, caminhando por aí em corpo de homem”, às vezes, “com trabalho de homem e famílias, finanças e responsabilidades” – mas homens inacabados.

Ainda assim, o que aconteceu ou não aconteceu em nossa trajetória não pode constituir eterno obstáculo ao nosso amadurecimento. É fácil transformar sofrimentos passados em desculpas para a nossa condição no presente. Afinal, para o primeiro Adão em nós, a culpa é sempre de outro...

Permita-me contar-lhe mais uma história. Pela pena de Lucas, o médico amado, ficamos sabendo que um jovem chamado João Marcos partiu de Jerusalém em viagem missionária como auxiliar de Paulo e Barnabé, e que posteriormente, em certo ponto da jornada, desistiu da missão, voltando para Jerusalém (Atos 13:13).


A razão da desistência não é revelada. Mas podemos imaginar que João ainda não se sentia pronto para suportar as agruras das missões evangelísticas. Mais à frente na história, Barnabé decide dar uma chance ao rapaz, chamando-o para lhe acompanhar em nova missão. Já Paulo, não achava justo levar o jovem desertor. A celeuma foi tamanha que os apóstolos tomaram rumos diferentes (Atos 14:36-39). Penso que tanto Barnabé quanto Paulo, cada qual a seu modo, contribuíram para o amadurecimento de João Marcos. A reprovação de Paulo o confrontou, a misericórdia de Barnabé, o encorajou. Cristo chama todos os homens à maturidade (Efésios 4:13), e instituiu homens-dons para ajudá-los a chegar lá (Efésios 4:12-13).



Se você, querido leitor, procurar atentamente, certamente encontrará esses homens. Deus os colocou perto de você. Alguns deles estão mortos, mas ensinam, por seus escritos. Outros estão vivos, e ministram por seus exemplos.

Cristo nos confronta e encoraja, para que sejamos os homens que Ele desejou que fôssemos, desde a eternidade passada.

Como escreveu o puritano Richard Sibbes, somos todos como caniços feridos, homens mergulhados em alguma miséria, levados por Cristo, a verem seus pecados como a causa de seu estado lastimável. Mas no meio dessa miséria, encontramos uma fagulha de esperança, e isso nos torna pavios que fumegam. O caniço ferido e o pavio que fumega compõem o estado de um pobre homem angustiado. E o que a Escritura diz? Cristo não quebrará o caniço ferido e não apagará o pavio que fumega (Mateus 12:20). Pelo contrário, Ele torna o caniço quebrado forte e sopra para alimentar a chama do pavio.


Bastar estar disposto.


O Senhor Jesus Cristo, o príncipe dos exércitos de Deus (Josué 5:14), nosso exemplo supremo, está em missão, e precisa de outros homens, para navegar sob seu comando.

Ele pergunta: Você está pronto?


 

Juliano Marold é Defensor Público e ilustrador. Escreveu para os volumes 01 e 02 da Revista CULTIVAR & GUARDAR. Casado com Gabriela, é pai da Sarah e do Daniel. Serve na Família dos que Creem, em Curitiba - PR.

 


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