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As Dores de Nossa Alma


Texto por: Dayse Fontoura

Fotografia: Tima Miroshnichenko


Você já deve ter ouvido pessoas tecendo críticas “ácidas” a alguém que demonstra, ao mesmo tempo, tristeza profunda e prolongada (“é melodramático”), desmotivação (“é preguiçoso”), baixa autoestima (“é complexado”), amargura (“é rancoroso”) e desesperança (“é cético”). Acredite-me: essas palavras não ajudam em nada a mudar a atitude da pessoa que sofre de depressão. A lista acima contém apenas alguns dos sintomas dessa doença psiquiátrica crônica — e eles vêm todos concomitantemente.


Todo ser humano sofre, em algum momento, daquela tristeza que advém de eventos adversos: o luto pela perda de um querido, pela perda do emprego e status social, pelo ambiente tóxico familiar, no trabalho ou escola, pelo diagnóstico de doenças graves, por exemplo. Mas, normalmente, com o tempo conseguimos vencer o impacto inicial da dor e a superamos ou aprendemos a conviver “amigavelmente” com ela. No entanto, para alguns, essa dor se torna patológica e ininterrupta. Passa o tempo, mudam as circunstâncias, porém a pessoa não consegue quebrar com o ciclo de sofrimento.


Precisamos aprender a agir com empatia. Em vez de críticas e impaciência, acolher e procurar entender a pessoa. Não precisamos ser psicólogos ou psiquiatras — embora a intervenção desses profissionais seja imperativa nesses casos — para cooperar com a recuperação do doente (sim, doente!). Ler livros, artigos e assistir vídeos de especialistas nesse assunto nos dá uma direção quanto a quais ações tomar.


Também pode ser que você seja a pessoa que está lutando com essa enfermidade de alma neste momento. Eu não sou especialista no assunto (desculpe se o decepciono), mas, como conselheira bíblica, tenho lidado com algumas pessoas que sofrem desse mal. O que procuro fazer é sempre trazer pequenas pérolas de esperança encontradas na Palavra de Deus. É isso que a minha formação e experiência me autorizam a fazer. Porém, creio que o direcionamento de profissionais especializados seja um excelente aliado na sua recuperação.


Não despreze a ciência (ela é um presente de Deus), mas não despreze o poder daquilo que Deus pode falar ao seu coração também, pois há um forte poder terapêutico nisso.

O caso mais clássico da Bíblia, em termos de depressão é Jó. Entretanto, vou falar de outro homem de Deus que sofreu duras provas que abalaram sua estrutura emocional — Elias. Esse profeta surge de repente na história bíblica, mas é um dos mais marcantes por sua personalidade e ministério. Sua atuação começou em um tempo de prosperidade material e falência espiritual em Israel. O rei que governava na época, Acabe, foi descrito como o pior de todos em termos de idolatria a perversão (1 Reis 16:30), e sua esposa, Jezabel, é conhecida por sua frieza calculista e paganismo exacerbado.


Elias sofria alienação por ser o profeta que denunciava publicamente os pecados de seus líderes. O povo não lhe dava atenção e continuava adorando deuses cruéis, em cultos que exigiam o sacrifício de crianças e a prática da imoralidade sexual. Elias viveu, por muito tempo no deserto, isolado e dependendo do sustento sobrenatural de Deus (1 Reis 17:1-5). Depois, em um período de escassez profunda devido à seca no país todo — seca profetizada por Elias como julgamento divino pelo pecado —, teve de fugir para um país estrangeiro, ficando abrigado entre os marginalizados pela pobreza (1 Reis 17:6-24), onde sua presença abençoadora trouxe sustento e vida.


Mais tarde, teve de esconder-se da perseguição e martírio que os profetas de Deus estavam sofrendo em Israel (1 Reis 18:4). Era chamado pelo rei de “perturbador de Israel” (v.17), como se ele, e não os pecados dos monarcas, fosse o responsável por toda a desgraça que ocorria.



Então, vem o conhecido evento de seu desafio aos 450 profetas de Baal e os 400 profetas de Aserá (o casal de deuses que exigia as práticas descritas anteriormente). Sem resposta às suas invocações aos seus ídolos, os profetas pagãos foram derrotados quando Deus derramou fogo do céu e consumiu todo o sacrifício apresentado por Elias (1 Reis 18). Aparentemente, o povo se aliou a ele e reconheceu o senhorio e a soberania de Deus. Mas, não foi bem assim. Depois da grande demonstração de poder pelo Senhor, todos voltaram à sua vida normal, pois a chuva voltara, também conforme a profecia de Elias.


Os eventos a seguir revelam a culminância dos seus sintomas de depressão. Após a enorme fatiga física para exterminar os falsos profetas, Elias teve de fugir a pé para o monte Horebe, a muitos quilômetros de distância do monte Carmelo, onde o desafio ocorrera, uma caminhada de 40 dias. Seu terror diante da ameaça de morte feita pela rainha Jezabel o venceu desta vez.


O profeta, supostamente invencível, foi vencido pelo medo, perdeu a esperança e a motivação para viver (1 Reis 19:3-4).

Em meio à sua peregrinação, foi levado por Deus a descansar e alimentado por anjos (vv.5-7). O Senhor então se manifesta ao profeta de forma não tão espetacular, como ele estava acostumado, mas num fogo e no cicio suave de uma brisa, aquecendo-o e acalmando sua agitação mental. Logo, lhe faz a intrigante pergunta: “O que você faz aqui?”, não porque não soubesse da resposta, mas para levar Elias a refletir sobre o que o levara a tal situação.


As palavras do profeta jorram como uma fonte de águas turbulentas. Está indignado, sentindo-se abandonado, incompreendido por todos (quiçá pelo próprio Deus, conforme pensava) e solitário. Deus o instruiu a voltar pelo mesmo caminho que viera e ainda mais ao norte, onde encontraria o homem que seria o instrumento da Sua justiça contra o ímpio rei de Israel.


O que aprendemos dessa história? Primeiramente, o sofrimento de Elias era real e o feria grandemente. Porém, sua avaliação da situação não estava correta. Ele nunca estivera sozinho, tinha a Deus e outras sete mil pessoas que concordavam com ele.


Normalmente, durante a depressão, a impressão de solidão e abandono é o que mais leva o sofredor ao ostracismo. Não, você não está sozinho. Talvez esteja procurando companhia no lugar errado.

Em segundo lugar, a caverna, que parece protegê-lo, é o que o isola ainda mais da vida. Para encontrar Deus, você terá de tomar a iniciativa de dar os primeiros passos para fora dela. Terceiro: busque descanso em meio à correria das demandas da sociedade atual. Você não precisa ser o melhor o tempo todo! Não é seu status social, sua profissão, sua vida familiar etc., que o define. Você é uma pessoa digna, não importa o quanto possam dizer o contrário. Deus o criou para Ele mesmo, e o ama incondicionalmente. Em quarto lugar, cuide de sua alimentação. Normalmente, o deprimido tem problemas alimentares: ou come exageradamente, descontando as frustrações no alimento, ou até se esquece de comer, por falta de motivação para viver. Em quinto lugar, fale de suas dores com Deus e com pessoas de confiança. Abra seu coração com honestidade a terapeutas e conselheiros, pois eles desejam e podem ajudá-lo.


Por último, abra seus ouvidos ao que Deus vai lhe falar de forma muito pessoal. Com Jó, Deus falou do meio de uma tempestade (Jó 38:1), com Elias, em meio a uma brisa suave. Ele vai adequar Sua comunicação ao seu estado de alma. Entretanto, Suas palavras lhe trarão consolo e força para cada dia, como o maná que caía do céu. Meu conselho? Leia o livro de Salmos e depois os evangelhos. Neles, você verá como os sofredores do passado encontravam motivação para continuar e como Jesus vem em resgate de todos os feridos oferecendo Seu descanso.

É de Cristo o amoroso convite: “— Venham a mim, todos vocês que estão cansados de carregar as suas pesadas cargas, e eu lhes darei descanso. Sejam meus seguidores e aprendam comigo porque sou bondoso e tenho um coração humilde; e vocês encontrarão descanso” (Mt 11:28-29, NTLH).


Há esperança para você!


 

Texto de Dayse Fontoura extraído e adaptado do livro A minha dor (in)visível — a depressão na primeira pessoa, de Geraldina Almeida. Publicado de forma independente em Cabo Verde, África.

 

Dayse Fontoura é consultora editorial e tradutora. Formada em Teologia e especializada em Antigo Testamento. Dayse é casada com Fabio Fontoura e mãe de um casal de filhos, de 26 e 25 anos. Faz parte da Família dos que Creem em Curitiba, PR.


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